terça-feira, 23 de setembro de 2008

Simples.

Há três tipos de pensamento:
Aquele que expresso;
o que só imagino
e aquele a que jamais tenho acesso.
O que lá é não determino...
Será razão ou sentimento?
-Assim me fico com este tormento.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Mérito.

Depois de ver
"A vida normalmente"

I
A injustiça começa à nascença, diz-se.
E o poeta pensa, o poema, e, com ele, o seu criador cresce.
Crescem, lado a lado, num turbilhão
de ideias, procurando, lentamente,
definição. Alma. Palavra. Concreto.

II
Crianças, quase adultos, nunca adultos,
como o poema. Ser criança é querer mudar o Mundo,
e acreditar. Quando tudo são escombros,
acreditar. Mas a linha da vida, como o poema,
é frágil. E foge, desvanece-se, imersa num sonho cruel,
na linha da frente da batalha, aparentemente perdida.

III

O meio faz-nos ou somos nós que fazemos o meio?
O poeta debate-se, esta é toda a sua vida.
Um homem pára, olha à sua volta, julga compreender,
procura compreender e interroga-se.
Todo o Mundo é nada, naquele segundo.
E, no vazio, tudo se cria.

IV
Não encontra definição. Escreve, como uma pergunta
infinita. A linha definha, foge, desvia-se do caminho.
Tudo volta a ser nada. E, rastejando, acredita. Está
tudo em nós. E a crença é o fim e o eterno
ínicio, para o homem que se constrói.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Absurdos de uma quinta-feira à noite.

Quantas filosofias
não criou já o meu vizinho
fumando o seu cigarro, enquanto observa,
da varanda, o Mundo?
Todas as noites, o seu olhar,
como que penetrando, no
recôndito
mais amargo de cada alma...
*
Espero fora da
nova loja ...

À minha esquerda, um homem
calvo, sonha (as revistas têm
esse poder) com os carros
que nunca terá-

Uma mulher com compras...

Como lhe pesam nos braços
frágeis... (Talvez lhe
pesem pelo mês inteiro)

A curiosidade
ingénua, naive,
bonita
da menina espantada

com o aquário cheio de peixes
dos mares por descobrir...

-E eu...
Espectador eterno...
Nascido para ver,
para reparar...
[ No pulsar inesgotável
do Mundo.
*
E agora, sozinho em toda a noite...
Não adormeço
porque há tantas estórias
por contar...

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Desabafo.

Não. Parem. Chega. São demasiados anos. Não aguento. A vossa voz...
Não estou onde quero estar. Talvez nunca esteja onde quero estar.
Calem-se, por favor. De certeza que isto não faz bem a ninguém.
Não, não fales comigo. Já devias saber que só estou sozinho, quando durmo.
Talvez nem aí. E é tudo o que prezo. O meu desassossego de
nunca estar onde quero estar. Só queria perceber-te.
A cabeça pesa-me, pesa-me, como se estivesse por cair, independente
de mim. Não fiz mal a ninguém, talvez porque nunca fiz nada.
Nunca fiz nada. Nunca estou onde quero estar.

Quero sair daqui. Vou sair daqui. Sim, é isso que quero.
Já não tenho idade para utopias. Independência. Isso, apenas isso.
Independência. Nunca fiz nada. Nunca estou onde quero estar.

Escape.

"Para ti é escrever. Para mim é o basket."

E há tanta metafísica nisto
e, ao mesmo tempo, tanta simplicidade que o poeta devias ser tu.


Auto-retrato.

Sou um cristão sem fé. A minha Bíblia é Pessoa. A minha crença é ser Humano.

O convite.

Certo dia, ao sair da escola
a carteira caiu-me. Lá dentro, um convite
p´rá a bola.
Um senhor
disse "Ah! Gente rica, até tem bilhete p´rá bola!"
E eu, sem saber se me ouviu, disse "É convite"
E vim-me embora a pensar
que, para mim, bola só mesmo com convite.
Por isso, ó nobre senhor,
peço-lhe, por favor
que, da próxima vez, evite
comentar o infortúnio alheio,
que nesta casa, é preciso cair terra e mar
para se ir à bola.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Mulheres.

Elas sorriem quando querem gritar.
Elas cantam quando querem chorar
Elas choram quando estão felizes
E riem quando estão nervosas.

Elas brigam por aquilo que acreditam.
Elas levantam-se para injustiça.
Elas não levam "não" como resposta quando
acreditam que existe melhor solução.

Elas andam sem novos sapatos para
suas crianças poder tê-los.
Elas vão ao medico com uma amiga assustada.
Elas amam incondicionalmente.

Elas choram quando suas crianças adoecem
e se alegram quando suas crianças ganham prémios.
Elas ficam contentes quando ouvem sobre
um aniversário ou um novo casamento.

Pablo Neruda.

Diz que sim.

E posto que viver me é excelente
cada vez gosto mais de menos gente.

Agostinho da Silva.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Labirinto.

"Perdi-me dentro de mim/Porque eu era labirinto,
E hoje, quando me sinto,/ É com saudades de mim."-
Dispersão, Mário Sá-Carneiro.

Sonho, um dia, encontrar-me
no final do labirinto.
Enfrentarei monstros diabólicos,
distâncias enormes, becos sem saída
e desorientação permanente.
Rastejarei, de joelhos bem no chão,
pedirei clemência ao tal Deus desconhecido
e rezarei sem rezar por salvação.
Suportarei o sol extenuante,
tempestades e as amarguras todas de São Pedro.
Não me perderei mais, porque perdido estava.
Mas chegarei ao fim!
E direi, alegre de mim, Ah, aí estás tu!
Eu.